terça-feira, 17 de janeiro de 2012

POLITICA 2012


Viver em sociedade significa existir, simultaneamente, em esfera pública e privada, além de ter direitos e deveres para com estas categorias. Fazer uso aleatório, sem qualquer regulamentação, destas esferas (ou do que faz parte delas) causa danos a diversos arranjos que asseguram o bom funcionamento da vida individual e coletiva, além de danos à confiança nas instituições que existem para regulá-las.

Separando o joio do trigo: a arquitetura dos sistemas

Sobre a arquitetura dos sistemas, consideremos, em primeiro lugar, que a política possui três dimensões interdependentes:
·                      a polity (regras do jogo político),
·                      a politics (a competição política; o próprio jogo), e
·                      a policy (políticas públicas; o resultado do jogo).
Portanto, boa parte do que se pensa sobre política precisa passar por este filtro classificatório. Atores políticos se comportam de maneira bastante diferente quando enquadrados em cada uma destas dimensões e, muitas vezes pela falta de esclarecimento a respeito da parte que não opera corretamente, corre-se o risco de se fazer avaliações equivocadas sobre os fatos.

Ninguém está acima da lei: a questão da confiança

No Estado Democrático de Direito, nenhum indivíduo pode estar acima da lei. No entanto, já dizia Marshall que, embora os homens sejam iguais em status – direitos e deveres –, jamais serão em poder. Este poder a que ele se refere é o propiciado pelo mérito, a ascensão social por meio do trabalho num contexto de livre mercado.
Mas uma coisa é a arregimentação de poder por meio de vias legais, outra é a arregimentação de poder por meio de conduta e práticas espúrias, o que acende discussões normativas e a respeito da manutenção de princípios éticos na política. Num contexto em que existe um relaxamento da responsabilização e das punições para aqueles que cometem infrações contra a ordem pública, seja no aspecto normativo ou moral, a política e suas instituições acabam por ficar desmoralizadas e desacreditadas.
Exemplos de fatos ocorridos durante o ano que contribuíram negativamente com o descrédito das instituições foram:
·                      a desmoralização, pelo próprio governo, da Comissão de Ética Pública, que sugeriu a saída de Carlos Lupi do Ministério do Trabalho, mas não foi considerada;
·                      a não cassação, pelo Parlamento, do mandato de Jaqueline Roriz, que recebeu dinheiro de Durval Barbosa. Jaqueline pediu a rejeição do parecer do Conselho de Ética sob o argumento que não exercia nenhum mandato quando o fato foi consumado; e
·                      a não validação do Ficha Limpa.
Afirmar que a sociedade não se esforça para “não demonizar a política” seria um erro, posto que os cidadãos procuram, ao menos, aceitá-la como é – considerando as imperfeições das instituições e a realidade da arquitetura do sistema político, também uma arena em que vale “quase tudo” para se manter no poder ou difamar, sem um argumento verdadeiramente producente, aqueles que estão no poder.
O que a sociedade não aceita é ausência de responsabilização daqueles que ferem princípios democráticos e republicados, permanecendo sem qualquer punição. Os mais politizados se perguntam ainda, entre outras coisas, por que a “faxina ética” precisa ser realizada pela imprensa e por que a atuação do governo é reativa e não ostensiva contra o próprio mal que lhe corrói. A impressão que se tem é que os comandantes dos altos postos administrativos deste país alienaram seu compromisso com a transparência e com as punições.
Afora as considerações acima, pesquisas realizadas pelo cientista políticos José Alvaro Moisés (USP) apontam que o grau de confiança em pessoas do núcleo privado é muito maior do que em relações interpessoais do núcleo público, bem como em diversas instituições representativas do regime democrático. Apesar de os dados corresponderem ao ano de 2006, são válidos para a reflexão da conjuntura porque apontam para uma tendência do comportamento social.
Neste ano, em resposta à conduta dos homens públicos e o funcionamento das instituições públicas, foram realizados inúmeros protestos que levantaram a bandeira contra a corrupção e a impunidade, e que reclamaram um melhor funcionamento ou a extinção de determinadas instituições. Os grupos – muito deles organizados na internet –, supostamente sem qualquer vinculação partidária, reuniram-se em diversas regiões, ora com um grande número de participantes, ora com baixíssimo número.
Apesar das boas iniciativas, as manifestações ocorreram mais de maneira espasmódica. Em um novo modelo de organização, carente de lideranças bem definidas, os grupos apareceram um tanto dispersos, muitos deles sem uma plataforma de atuação ou projeto mais bem estruturado.  Em suma, apareceram com uma força muito menor do que aquela que originou a Primavera Árabe – a mobilização social iniciada na internet que desencadeou uma série de reformas políticas em países do Oriente Médio e da África.
Que venha 2012.